Inveja!
Toda
a humanidade sofre de uma doença congênita e hereditária chamada
"pecado". Ela nasce com o ser humano, e está entranhada no mais
profundo de seu ser. As manifestações do pecado são múltiplas e multiformes. A
inveja é apenas uma delas.
Ocorre
que a maioria das pessoas tem uma ideia sobre uma grande parte dos termos e
conceitos usados correntemente. É o caso da inveja, do amor, do ciúme, do
romantismo e milhares de outros. "Todo mundo" fala sobre isto, mas
quando pedimos para que sejam definidos, conceituados, quase ninguém consegue,
porque quase ninguém sabe. E quem se arrisca a fazer uma colocação sobre o
termo, começa dizendo "pra mim".
No hebraico, qinah, «zelo»,
«ciúmes», «inveja». Essa palavra é empregada por quarenta e duas vezes,
como, por exemplo, em Jó 5.2; Provérbios 14.30; 27.4; Eclesiastes 4.4; 9.6;
Isaías 11.13; 26.11; Ezequiel 35.11. Também é usado o adjetivo
«invejoso», no hebraico, gana, conforme se vê em Salmo 37.1; 73.3; Provérbios 24.1
e 19.
No grego, phthónos, «inveja»,
«ciúmes». Esse vocábulo ocorre por nove vezes: Mateus 27.18; Marcos 15.10;
Romanos 1.29; Gálatas 5.21; Filipenses 1.15; I Timóteo 6.4; Tito 3.3;
Tiago 4.5; I Pedro 2.1. Algumas versões também traduzem como tal o vocábulo
grego zelos, mas este último tem mais o sentido de «zelo», «ardor».
Na mitologia grega, Ftono (em grego Φθονος,
"inveja", "ciúme") é a personificação e o deus dos ciúmes e
da inveja.
A
palavra portuguesa «inveja» vem do latim, invidere, que significa
«em» (contra) e «olhar para», ou seja, olhar para alguém com maus olhos, de
modo contrário, com base no ódio sentido contra esse alguém. A inveja sempre
envolve um certo ressentimento, mas alguns conseguem disfarçar muito
bem a sua inveja, transmutando-a em zelo por alguma causa, mas sempre com
alguém a ser combatido sem verdadeiras causas. O homem é um ser extremamente
egoísta, ressentindo-se diante do sucesso ou da boa sorte de seus semelhantes.
A
palavra grega phthónos, traduzida por “invejas”, vai além dos ciúmes. E o
espírito que deseja não somente as coisas que pertencem aos outros, mas se
entristece pelo fato de outras pessoas possuírem essas coisas. Os invejosos não
apenas desejam o que pertence aos outros, mas anseiam que os outros sofram por
perder essas coisas. Trata-se das pessoas que se alegram com a tristeza dos
outros. Não é tanto o desejo de ter as coisas, mas o desejo de que os outros as
percam. E entristecer-se por algum bem alheio. Eurípedes chamou a inveja de “a
maior enfermidade entre os homens”.
Inveja
é um sentimento ou não?
Inveja
é uma emoção, como quase todas as obras da carne. Uma emoção que é um misto de
vários fatores: vaidade, cobiça, frustração (incapacidade) e ódio (ou raiva).
Vaidade
porque o invejoso é uma pessoa que quer sempre ser o melhor em tudo, o centro
das atenções, o objeto dos comentários e dos suspiros alheios; quer ser invejado
pelos demais. Nessa ânsia de ser admirado e invejado, o invejoso está sempre
querendo mostrar o que tem (mesmo que não tenha), o que é (mesmo que não seja),
e o que pode (mesmo que não possa).
Cobiça
porque nessa ânsia de ser invejado, o invejoso quer sempre o que está além de
suas posses e de suas capacidades. Frustração
porque o invejoso sofre por não ser ou ter o que acha que deveria ser ou ter. E
depois surge a raiva em seu coração, e assim, a necessidade de descarregar essa
ira, essa raiva, essa frustração em forma de uma vontade de ferir, de magoar,
de destruir, de fazer sofrer.
A
inveja sempre tem duas vítimas: o próprio invejoso, e a pessoa de quem o
invejoso sente inveja. O invejoso é sempre uma vítima de seu sentimento
maligno, porque o faz sofrer. Remói a sua incapacidade, se martiriza e é
infeliz por que não se contenta com o que é e nem com o que tem.
E
a inveja sempre tem outra vítima: a pessoa de quem o invejoso sente inveja. O
invejoso sempre elege alguém que tenha algo que o faça ser amado, querido e
desejado. Algo que o torne popular. Uma popularidade que o invejoso quer ter a
qualquer custo: uma mulher bonita ou um marido bonito, sucesso, um carro, uma
voz sedosa, um bom emprego, bons filhos, uma roupa bonita entre outros.
No
Antigo Testamento. Os Dez Mandamentos proíbem o sentimento invejoso,
embora ali a própria palavra hebraica, qinah, não seja usada.
Mandamentos específicos contra a inveja podem ser encontrados nos livros de
Salmos, de Provérbios e em vários outros contextos. Ver, por exemplo, Provérbios
3.31; 23.17; O trecho de Eclesiastes 4.4 encerra uma interessante observação
sobre o assunto. Ali os homens são exortados a trabalhar e a desenvolver suas
habilidades pessoais, quando sentirem inveja de outrem. Assim, uma coisa boa
pode resultar de uma atitude errada. O homem é capaz de qualquer coisa ruim.
Exemplos veterotestamentários de inveja podem ser encontrados nas
vidas de Jacó e Esaú, Raquel e Lia, os irmãos de José e ele mesmo. Os
irmãos de José venderam-no como escravo, movidos por pura inveja. Um dos
relatos mais tocantes da Bíblia é o de Hamã e Mordecai, no livro
de Ester. A inveja tem sido motivo para muitas histórias pervertidas, para
muitos dramas humanos.
No
Novo Testamento. Dentro da lista de vícios humanos, preparada por Paulo,
em Romanos 1.29, a inveja ocupa posição proeminente, associada ao
homicídio e ao ódio contra Deus. Isso é muito sugestivo, pois parece que o
invejoso, não podendo atacar a Deus diretamente (a quem considera a causa de
seu insucesso), volta-se contra um outro ser humano, que parece
ameaçá-lo com o seu sucesso (real ou imaginário). O trecho de Gálatas 5.19 alista
a inveja como uma das obras da carne, que formam contraste direto com o cultivo
dos frutos do" Espírito. — Paulo advertiu Timóteo para não se
envolver em controvérsias e disputas mórbidas, as quais conduzem, entre outras
coisas, à inveja (I Timóteo 6.4). Tito também foi devidamente instruído quanto
à inveja (Tito 3.3). O caso mais trágico de inveja, nas páginas da Bíblia
é o dos líderes judeus, que fizeram de Jesus Cristo a vítima de sua inveja (Mateus
27.18). O distorcido motivo deles era tão óbvio que o próprio Pilatos,
governador romano, percebeu o mesmo, embora fosse homem fraco demais para
pôr-se ao lado do direito.
Mesmo
que não o perceba ou admita, o invejoso culpa a pessoa invejada pelo seu
insucesso, pela sua dor e sua frustração. E aí vem a raiva, o ódio, o desejo de
magoar, ferir, fazer sofrer e destruir o "culpado" pelo fracasso
desse invejoso em sua ânsia de ser o centro das atenções, o vencedor, o
aclamado pelas multidões...
Todas
estas manifestações e colocações que aqui faço nunca aparecem em suas exatas
proporções. Isto é, não é porque tudo o que coloco não aparece é que a inveja
deixa de existir, mas as colocações que agora faço podem aparecem em maior ou
menor grau.
O
problema maior da inveja são as suas consequências (como em toda escolha). Há
pessoas que conseguem dissimular e esconder a sua inveja, e não causam nenhum
mal senão a si próprio, mas na maioria das vezes a inveja causa dor e
destruição. O invejoso sempre dá um jeito de se vingar do invejado, de lhe
causar alguma forma de dor e sofrimento (humilhação e constrangimento são os
mais comuns).
O
invejoso sente uma mórbida satisfação em ver o sofrimento e a dor do invejado.
Isso se chama "perversidade". Pregadores, músicos e cantores
invejosos estão sempre a apontar os erros e os deslizes de quem sentem inveja,
e estão sempre tentando expô-los ao ridículo, não raro distribuindo e
fomentando (ou fermentando) "informações inverídicas ou distorcidas"
(popular "fofoca").
Uma
lenda grega!
Era
uma vez um rei chamado Dionísio, monarca de Siracusa, a cidade mais rica da
Sicília. Vivia num palácio cheio de requintes e de belezas, atendido por uma
criadagem sempre disposta a fazer-lhe as vontades. Naturalmente, por ser rico e
poderoso, muitos siracusanos invejavam lhe a sorte. Dâmocles estava entre eles.
Era dos melhores amigos de Dionísio e dizia-lhe frequentemente: Que sorte a
sua! Você tem tudo que se pode desejar. Só pode ser o homem mais feliz do
mundo! Dionísio foi ficando cansado de ouvir esse tipo de conversa. Assim,
certo dia propôs ao amigo a experiência de passar um dia, um dia apenas em seu
lugar, como monarca, desfrutando de tudo aquilo. Este aceitou imediatamente com
alegria.
No
dia seguinte, Dâmocles foi levado ao palácio e os criados reais lhe puseram na
cabeça a coroa de ouro, e o trataram como rei. Recostou-se em almofadas macias
e sentiu-se o homem mais feliz do mundo. Ah, isso é que é vida! – Confessou a
Dionísio, que se encontrava sentado à mesa, na outra extremidade. “Nunca me
diverti tanto.” Subitamente, Dâmocles enrijeceu-se todo. O sorriso fugiu-lhe
dos lábios e o rosto empalideceu. Suas mãos estremeceram. Esqueceu-se da
comida, do vinho, da música. Só queria ir embora dali, para bem longe do
palácio, para onde quer que fosse. Percebeu que pendia bem acima de sua cabeça
uma espada, presa ao teto por um único fio de crina de cavalo. A lâmina
brilhava, apontando diretamente para seus olhos. Ficou paralisado, preso ao
assento. Tentou levantar, mas não conseguiu, por medo de que a espada, com um
movimento seu, pudesse lhe cair em cima.
O
que foi, meu amigo? – Perguntou Dionísio. – Parece que você perdeu o apetite.
Essa espada! Essa espada! – Disse o outro, num sussurro. – Você não está vendo?
É claro que estou. Vejo-a todos os dias. Está sempre pendendo sobre minha cabeça
e há sempre a possibilidade de alguém ou alguma coisa partir o fio. Um dos meus
conselheiros pode ficar enciumado do meu poder e tentar me matar. As pessoas
podem espalhar mentiras a meu respeito para jogar o povo contra mim. Pode ser
que um reino vizinho envie um exército para tomar-me o trono. Ou então, posso
tomar uma decisão errônea que leve à minha derrocada. Quem quer ser líder
precisa estar disposto a aceitar esses riscos. Eles vêm junto com o poder,
percebe? É claro que percebo! – Disse Dâmocles. Vejo agora que eu estava
enganado e que você tem muitas coisas em que pensar além de sua riqueza e fama.
Por favor, assume o seu lugar e deixe-me voltar para a minha casa. Até o fim de
seus dias, Dâmocles não voltou a querer trocar de lugar com o rei, nem por um
momento sequer.
Antes
de deixar que a inveja cresça em nosso coração, lembremos da espada de
Dâmocles.
Toda riqueza, todo poder, toda fama vem com uma série de decorrências naturais que devem ser consideradas. Não nos deixemos consumir por esta luta incessante do orgulho, da vaidade não satisfeita.
Toda riqueza, todo poder, toda fama vem com uma série de decorrências naturais que devem ser consideradas. Não nos deixemos consumir por esta luta incessante do orgulho, da vaidade não satisfeita.
Seja
como for, a inveja é uma atitude diabólica, conforme assevera I João 3.12. A
inveja, como já dissemos, é uma das obras da carne, pelo que é natural para o
ser humano decaído (Gálatas 5.21). A inveja é uma das mais feias e mais tristes
misérias do nosso globo e na teologia moral posterior, a inveja é alistada
entre os pecados mortais.
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