sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Prostituição - Pecado de julgamento Divino.



Prostituição
Sempre que alguém discorre sobre a prostituição, remonta às origens dela recordando a prostituição hospitaleira dos caldeus, ou a sagrada da Babilônia. Ora, a prostituição nunca foi “sagrada nem hospitaleira”, porque tem sido sempre infame, como o mercantilismo que a tornou possível.

A prostituição na pré-história
Lá atrás, no período da pré-história, a mulher era associada à Grande Deusa, criadora da força da vida, e estava no centro das atividades sociais, explica Nickie Roberts, no livro As Prostitutas na História. Com tal poder, ela controlava sua sexualidade. Nessas sociedades pré-históricas, cultura, religião e sexualidade estavam interligadas, tendo como fonte a Grande Deusa, conhecida inicialmente como Inanna e mais tarde como Ishtar.

A prática dos antigos povos do Oriente, seguida ainda hoje por muitas tribos selvagens de oferecer as mulheres e as filhas aos hospedes e forasteiros, nada tem com a prostituição. É o segmento da tradição poligâmica da comunidade primitiva das mulheres. O caráter religioso, isto é, mágico, que sempre andou ligado às revelações sexuais, entre esses povos, levou-os a consagrarem templos aos deuses e deusas da fecundação.

O contributo que as mulheres da Babilônia eram chamadas a dar ao culto de Milita, oferecendo-se, pelo menos uma vez por ano, aos que visitavam o templo, não significa também que houvesse prostituição. Dado que a poliandria e a promiscuidade eram a tradição, o restabelecimento dessa prática com fins religiosos mediante um donativo para o culto, de maneira nenhuma se deve aproximar da prostituição, exercida permanentemente como profissão, com um objetivo mercantil.

Por volta de 3.000 a.C., tribos nômades passaram a criar gado e tornaram-se conscientes do papel masculino na reprodução. As sociedades matriarcais da deusa começaram a ser subjugadas. As primeiras civilizações da era histórica desenvolveram-se na Mesopotâmia e no Egito, e nasceram desse levante. Novas formas de casamento foram introduzidas. “Foi nesse momento da história humana, em torno do segundo milênio a.C., Que a instituição da prostituição sagrada tornou-se visível e foi registrada pela primeira vez na escrita”, explica Nickie.

Um vestígio dessa tradição existe ainda hoje nas chamadas “festas de caridade”, em que damas da alta roda ou atrizes em evidência, põem em leilão um beijo a favor de obras beneficentes. Esse costume: a retribuição monetária de uma prazer embora com objetivos altruístas – não é por ninguém considerado um ato de prostituição, nem prostitutas, apenas por isso, aquelas que o praticam.

As primeiras prostitutas da história
As grandes cidades da Mesopotâmia e do Egito continuaram centralizadas nos templos da Grande Deusa. As sacerdotisas dos templos, que participavam de rituais sexuais religiosos, ao mesmo tempo mulheres sagradas e meretrizes, foram as primeiras prostitutas da História, conta Nickie Roberts.

O status dessas mulheres era elevado. Os reis precisavam buscar a benção da deusa, por meio do sexo ritual com as sacerdotisas, para legitimar seu poder. “Nessa época, as prostitutas do mais alto escalão do templo eram, por direito nato, agentes poderosas e prestigiadas; não eram as meras vítimas oprimidas dos homens, tão protegidas pelas feministas modernas”, escreve Nickie Roberts.

A Suméria criou a segregação feminina ao colocar em lados opostos a esposa obediente e a prostituta má. Júlio Gralha, professor do NEA/UERJ, lembra que a visão sobre as prostitutas da época é pouco documentada de forma escrita, mas pode ser inferida pelas imagens das iconografias. “Pela análise da iconografia, a prostituta existia no Egito e atuava de forma remunerada.

Há contos iconográficos, cômicos, em que a prostituta é vista como poderosa, o homem não aguenta. Como aparecem o colar e outros símbolos ligados à deusa, elas são vistas como protegidas. A prostituição não era algo repulsivo ou condenado pela religião”, diz Gralha.

Prostituição na Grécia – Negócio organizado
A prostituição é a cristalização da promiscuidade com fins mercantilistas. À tradição e aos costumes não repugnava – nuca repugnou – a poligenia e poliandria, isto é, as relações sexuais de um homem com muitas mulheres e destas com muitos homens.

O mercantilismo aproveitou-se dessa disposição natural, para fins comerciais, rodeando a prostituição de leis, de privilégios, de repressões de tabus, que visavam e visam a proteger o negócio.

Vejamos como as coisa se passaram, na Grécia, o território tipo da civilização antiga, em que cada cidade era uma autarquia. Parece não haver dúvidas de que no tempo de Cekrops, o fundador de Atenas (1.600 a.C.) reinava a comunidade das mulheres.

A Grécia antiga foi uma típica sociedade patriarcal. As mulheres não podiam participar da vida política e social. No entanto, como aconteceu a todas as sociedades antigas, os primeiros habitantes da Grécia foram povos adoradores da deusa, afirma Nickie.

Os deuses masculinos só vieram mais tarde, por volta de 2.000 a.C., com os invasores indo-europeus. As duas culturas fundiram-se e produziram o híbrido que chegou até nós. Basta lembrar que Zeus, divindade suprema indo-europeia, casou-se com Hera, poderosa deusa sobrevivente do culto anterior.

Com o consolidar da civilização, o princípio da propriedade individual tomou vulto, o mercantilismo apareceu, gerando um e outro, por um lado a acumulação de riquezas e por outro o pauperismo. Daí, surgiu a prostituição que é a sua consequência imediata.

Sólon, que governou Atenas na virada do século VI a. C., tendo institucionalizado os papéis das mulheres na sociedade grega, e percebendo os lucros obtidos pelas prostitutas – tanto as comerciais quanto as sagradas - organizou o negócio, criando bordéis oficiais, administrados pelo Estado. E assim “satisfazer as necessidades do povo “, sendo por isso muito louvado por seus aduladores.

Neles, havia grande exploração das mulheres. Junto com os bordéis oficiais, muitas meretrizes independentes exerciam o seu comércio, apesar da legislação de Sólon. “Pela primeira vez na História, as mulheres estavam sendo cafetinadas – oficialmente. (…) Assim, de mãos dadas, nasceram a cafetinagem estatal e privada”, afirma Nickie.

Maria Regina Cândido, historiadora da UERJ, lembra que foi a pressão sobre a terra, com o grande aumento da população grega, que levou Sólon a criar os primeiros bordéis. Isso porque ele trouxe para a região estrangeiros ceramistas, com o intuito de ensinar à população excedente uma nova atividade, já que a agricultura não absorvia mais a todos.

“Para que os estrangeiros não molestassem as esposas e filhas de cidadãos gregos, ele criou um espaço de prostituição oficial na periferia da cidade, os bordéis”, explica a coordenadora do NEA.

Segundo Maria Regina, as prostitutas ficavam em frente ao cemitério, na região do cerâmico, onde estavam instaladas as oficinas dos ceramistas, e também na região do Porto do Pireu, onde eram chamadas de porné, daí vem a palavra pornografia.

As prostitutas vulgares eram escravas e tinham o nome de porné; a casa onde exerciam o seu comércio era o porneion; e os industriais que exploravam o negócio eram os pornoboskoi. Essas mulheres pagavam um tributo pornokontelas e dependiam da autoridade dos magistrados agoranomos, que vigiavam a sua maneira de proceder. Viviam em Atenas num bairro reservado que tinha o nome de Cerâmico.

A prostituição sagrada também sobreviveu, embora timidamente, durante o período da Grécia clássica. Havia templos em toda a Grécia, especialmente em Corinto – dedicado à deusa Afrodite. As prostitutas do templo não mais eram vistas como sacerdotisas, eram tecnicamente escravas. Mas, por serem consideradas criadas da deusa, mantinham a aura de sacralidade e eram homenageadas pelos clientes. “Demóstenes pagava caro por essas prostitutas. Ele ia de Atenas até Corinto só para ter relações sexuais com elas”, diz Maria Regina.

Outra classe de prostitutas superiores a esta era a das que exerciam as profissões de dançarinas, cantoras, tangedoras de instrumentos musicais.

Eram as bacantes, também chamadas etéreas aulétridas e dictéredas. Tomavam parte nas festas e banquetes e na retribuição pelos serviços da sua arte estava envolvida a da sua condescendência com seu anfitrião e seus convidados. Em regra, mulheres livres, entre elas se recrutavam as sacerdotisas de Diónisos e de Vênus Cotito.

As prostitutas do templo de Afrodite deixaram de ser vistas como sacerdotisas e viraram escravas. Muitas prostitutas eram cultas e instruídas, e cumpriam o papel de entreter os líderes daquela sociedade. Cobravam alto preço por sua companhia e podiam ou não ceder aos desejos sexuais do cliente.

A classe das hetairas, que se tem pretendido colocar como a de mais alto grau das prostitutas da Grécia, era constituída por mulheres livres, cultas e famosas, que recebiam em suas casas os políticos, os generais, os filósofos e os poetas, raras vezes, mantendo relações sexuais, simultâneas, com mais de um. A significação de hetaira é: companheira, amiga, amante. Eram lícitas e regulares as relações íntimas com elas.

Na época brilhante da civilização grega, no templo de Sócrates, de Platão, de Demóstenes, as leis e os costumes permitiam aos cidadãos possuir três mulheres: a hetaira, especialmente para os prazeres do espírito; a palaca, para a direção dos serviços domésticos; e a esposa, para a procriação dos filhos legítimos.

As leis de Drácon sancionavam essas uniões a três, declarando livres os filhos delas, punindo as palacas e esposas que praticavam o adultério.

À poligamia dos homens correspondia a poliandria das hetairas, ou melhor, uma “monogamia periódica sucessiva”.

Havia duas classes de hetairas em Atenas e Corinto:

·        A primeira compunha-se de mulheres letradas;
·     A segunda compreendia as mulheres que, pela sua beleza, sua graça ou o seus espírito, se tornavam as favoritas dos grandes, dos príncipes e dos reis.

As primeiras não se vendiam às riquezas, o único desejo de se instruírem impelia-as a colocarem-se acima da opinião e a preferirem a vida livre à vida obscura da casa. Escolhiam o homem que lhes convinha e viviam maritalmente com ele.

As segundas, menos instruídas, mas não menos amáveis, procuravam a fortuna e tornavam-se as favoritas – as mulheres pela cabeça e pelo coração, - de homens ricos e poderosos.

Um exemplo das primeiras a sábia Aspásia, mulher de Péricles e sua inspiradora: das segundas a famosa Laís, a quem em vida foi erguido um monumento com esta inscrição: “À benfeitora Laís o povo de Corinto agradecido”.

Prostitutas livres no Império Romano
Roma foi diferente da Grécia. Até o início da República, a prostituição não era tão disseminada no território romano. “Roma ainda era muito provinciana, fechada”, explica Ronald Wilson Marques Rosa, historiador e pesquisador do NEA/UERJ. A prostituição apenas se difundiu com a expansão militar do império romano e a conquista de escravos.

Antes desta expansão, há indícios de que entre os primeiros romanos, que eram povos agrícolas, existia a antiga religião da deusa, diz Nickie Roberts. Ela também afirma que, em tempos posteriores, a prostituição religiosa estava ligada à adoração da deusa Vênus, que era considerada protetora das prostitutas.

Após a expansão militar e territorial, “os escravos eram os prostitutos, tanto homens quanto mulheres. E não havia estigmatização, não era algo mal-visto. Era normal o uso comercial do escravo para a prostituição. E, muitas vezes, eles usavam esse dinheiro para conseguir a liberdade”, diz Ronald Rosa.

De acordo com Nickie, Roma foi uma sociedade sexualmente muito permissiva. Eles escarneciam de qualquer noção de convenção moral ou sexual e desviavam-se de toda norma que houvesse sido inventada até então”, afirma.

A grande expansão urbana favoreceu o crescimento da prostituição. A vida era barata, e o sexo, mais barato ainda, diz a autora. Prostituição, adultério e incesto permearam a vida de muitos imperadores romanos. “Falando de modo geral, a prostituição na antiga Roma era uma profissão natural, aceita, sem nenhuma vergonha associada a essas mulheres trabalhadoras”, comenta Nickie.

A vida permissiva levava mulheres a rejeitar o casamento, a ponto de o imperador Augusto estabelecer multas para as moças solteiras da aristocracia em idade casadoira. Muitas se registraram como prostitutas para escapar da obrigação. O sucessor de Augusto, Tibério, proibiu as mulheres da classe dominante de trabalhar como prostitutas.

Diferente da Grécia, os romanos não possuíam e nem operavam bordéis estatais, mas foram os primeiros a criar um sistema de registro estatal das prostitutas de classe baixa. Isso resultou na divisão das prostitutas em duas classes, explica Nickie: as meretrices, registradas, e as prostibulae (fonte da palavra prostituta), não registradas. A maior parte não se registrava, preferia correr o risco de ser pega pela fiscalização, que era escassa.

Vocabulário da prostituição na Roma Antiga
Aedile - O funcionário, cujo dever era o de registrar prostitutas e prender aquelas que praticavam o ofício sem licença, uma vez que ele e seus comandados normalmente podiam ser subornados com dinheiro ou favores, ele é o protótipo do cafetão, tão comum em nossos dias.

Aelicariae - Prostitutas que trabalhavam no pátio dos templos, elas vendiam favores sexuais e pequenos bolos feitos na forma da genitália masculina ou feminina para o sacrifício a Vênus ou Príapo.

Amasiae - Mulheres que se prostituíam em tempo parcial, como uma forma de adoração à Vênus.

Ambubiae - Cantoras profissionais, a maioria dos quais se prostituía, pelo menos a tempo parcial.

Amica - Prostituta que também atendia a clientes do sexo feminino.

Ancillae ornatrices - Servas que ajudavam as prostitutas ou cortesãs a limpar-se, pentear o cabelo, entre outros afazeres.

Aquarii - Funcionários em bordéis que serviam vinho e outras bebidas, além de levar água para a higiene das profissionais do estabelecimento.

Blitidae - Prostitutas que trabalhavam em tabernas, cujo nome provém do vinho barato (blitum) vendido nesses estabelecimentos.

Bustuariae - Carpideiras que se prostituíam em cemitérios, nas cerimônias de funeral. Eles costumavam entreter seus clientes sentadas em lápides ou deitadas em criptas.

Citharistriae - Harpistas profissionais, a maioria das quais se prostituía, pelo menos a tempo parcial.

Delicatae - Prostitutas de luxo, algumas das quais também eram atrizes.

Diobolares - Prostitutas de rua muito baratas, cujos préstimos custavam apenas dois óbolos.

Diversorium - A pensão que alugava quartos para prostitutas.

Famosae - Cortesãs das classes superiores, que sem qualquer necessidade material, se prostituíam por prazer.

Fellatrix - Prostitutas especializadas em felação, a maioria delas trabalhava em casas de banho.

Forariae - Aquelas que praticavam seu comércio em estradas rurais perto de Roma, cujos principais clientes eram viajantes.

Fornicatrices - Aquelas que exerciam a profissão debaixo dos arcos de pontes e edifícios.

Fórnices - Os arcos debaixo dos grandes edifícios romanos, em cujos recessos sombrios muitas prostitutas entretiam seus clientes. Nossa palavra "fornicação", é derivada dessa prática.

Leno - Um bordel. A gerente ou a dona do lugar era uma lena.

Lupae - Prostitutas que atraíam os clientes, uivando como lobos.

Lupanar - Bordel. Sob a lei romana, bordéis só eram autorizados a operar a partir de 15:00 horas até a madrugada.

Noctilucae – Prostitutas que trabalhavam somente à noite.

Nonariae - Baixa classe de meretrices, cujas licenças limitadas lhes permitiam trabalhar somente a partir de 21:00 até a madrugada.

Quadrantariae - Prostitutas escravas.

Scortum - Um termo geral para qualquer prostituta da classe baixa.

Stabula - Um bordel composto por uma grande sala onde o sexo ocorria à vista dos outros clientes e prostitutas.

Tabernae - Padarias. A maioria dos padeiros alugava pequenos quartos em seus porões para prostitutas, mas, uma vez que estas instalações eram frequentemente invadida por Aediles, que procuravam prostitutas não licenciadas, quem frequentava esses lugares tinha que entrar e sair o mais rápido possível. Os padeiros, é claro, também forneciam bolos à aelicariae.

Tugurium - Uma cabana alugada por um preço extremamente baixo para prostitutas cujos clientes queriam maior privacidade.

Turturillae - ("casas de pombo") grandes gaiolas em que algumas prostitutas entretiam os clientes, método geralmente usado por prostitutos travestis.

Venerii - Prostitutas-sacerdotisas de Vênus, que ensinavam técnicas sexuais para cortesãs, de acordo com alguns historiadores, elas praticavam uma disciplina espiritual semelhante ao tantrismo.

Villicus - Espécie de recepcionista e caixa em um bordel, que conhecia as habilidades e atributos de todas as moças da casa e respondia às perguntas dos clientes.


 Condenadas na Idade Média
Com o declínio do Império Romano, começou a Idade Média. Os invasores, guerreiros bárbaros, organizam a vida não mais em grandes cidades e sim em aldeias agrícolas, que não favoreciam a prostituição como a vida urbana. “As artes civilizadas do amor, do prazer e do conhecimento – o erótico e os demais – desapareceram durante a Idade das Trevas.

Apesar de condenada, a prostituição foi tolerada pela igreja, que a considerou “uma espécie de dreno, existindo para eliminar o efluente sexual que impedia os homens de elevar-se ao patamar do seu Deus”, explica Nickie.

A igreja condenava todo relacionamento sexual, mas aceitava a existência da prostituição como um mal necessário. De acordo com Jacques Rossiaud, autor de A Prostituição na Idade Média, “pode-se afirmar, sem receio de erro, que não existia cidade de certa importância sem bordel”.

Havia bordéis públicos, pequenos bordéis privados e também casas de tolerância - os banhos públicos. Além disso, continuavam a existir as prostitutas que trabalhavam nas ruas. Em tese, o acesso aos prostíbulos públicos era proibido para homens casados e padres, mas eles encontravam meios de burlar a legislação. 

Rossiaud escreve que as prostitutas não eram marginais na cidade, mas desempenhavam uma função.

Nem eram objeto de repulsão social, podendo, inclusive, ser aceitas na sociedade e casar-se depois que deixassem a vida de prostituta.

A liberdade sexual só era tolerada para os homens. As mulheres casadas e suas filhas, de boa família, deviam temer a desonra. Mas, de acordo com Rossiaud, essa liberdade masculina não sobreviveu à “crise do Renascimento”. Houve uma progressiva rejeição da prostituição, que revelava nas comunidades urbanas a precariedade da condição feminina.

“Lentamente, a mulher conquistou uma parte do espaço cívico, adquiriu uma identidade própria, tornou-se menos vulnerável”, explica Rossiaud. E houve uma revalorização do casal.

Prostituição e violência aparecem pela primeira vez associadas, devido a brigas, disputas e assassinatos nos locais públicos. Autoridades municipais, apoiadas pela Igreja, passaram a coibir a prostituição que, a partir de então, “aparecia como um flagelo social gerador de problemas e de punições divinas”, afirma Rossiaud. Um após outro, os bordéis públicos foram desaparecendo. 

“A prostituição não desapareceu com eles, mas tornou-se mais cara, mais perigosa, urdida de relações vergonhosas”, diz Rossiaud. Para o autor, foi o “duplo espelho deformante do absolutismo monárquico e da Contra-Reforma” que fizeram parecer “decadência escandalosa o que era apenas uma dimensão fundamental da sociedade medieval.”

A socialização das Mulheres
A prostituição correspondeu em determinado momento a uma necessidade social? Evidentemente. Se assim não fosse não teria surgido. A civilização e as suas consequências: o urbanismo, a sociedade privada, o mercantilismo, a acumulação de riquezas, o pauperismo, alteram o ritmo natural da vida e necessariamente o das manifestações sexuais.

Homens de determinadas classes, em virtude do pauperismo ou em razão de suas funções, não podiam ter uma mulher privativa.

Os de outras classes, por força de riquezas auferidas no mercantilismo desejariam dispor de dezenas delas, sem contudo constituírem um harém. No primeiro caso estavam, por exemplo os soldados; no segundo, os mercadores.

Surgiu, então, a instituição da mulher comum, para a manutenção da qual todos concorriam com uma quantia sempre inferior à que teriam de dispender com umas ou mais mulheres permanentes e privativas. Em compensação aboliam, para elas, o tabu do exclusivismo, concedendo-lhes a faculdade de terem relações com quem quisessem.

Por um tácito acordo, os habitantes da cidade, pertencente a todas as classes, estabeleceram a socialização das mulheres. Feita a socialização das mulheres, por tal acordo, logo o mercantilismo aproveitou disso para negociar. O que era, digamos assim, uma indústria doméstica, passou a ser uma fábrica, com várias operárias: o porneion grego, com seu industrial dirigente, o pornoboskoi.

Os magistrados e a lei regularam o funcionamento desse negócio, proibindo que o exercessem pessoas não inscritas. Os edis de Roma tinham os registros das prostitutas de cada bairro e perseguiam as que se entregavam à profissão clandestinamente.

Os partidários da atual e infamante regulamentação do meretrício não ousarão dizer que, nesse tempo, tais medidas visavam a defesa sanitária dos clientes das prostitutas.

A clientela desse comércio era – como ainda hoje, - formada pelos rapazes que não podem, em razão da idade, ter encargos de família: pelos tímidos, os defeituosos, os decrépitos ou quase impotentes, sem possibilidades físicas para agradar a uma mulher normal: pelos pervertidos que, numa manifestação de masoquismo, só têm prazer junto de mulheres públicas, e pelos homens relativamente normais, que não encontrando satisfação sexual junto de suas esposas procuravam obtê-la através das sucessivas e fugazes uniões com prostitutas.

As limitações de ordem religiosa, moral e fisiológica, opostas à livre satisfação do desejo sexual do homem levaram a manter essa instituição pública do meretrício, a socialização das mulheres, resto, para eles da promiscuidade primitiva e para elas da escravidão milenária.

Essa casta de mulheres que nos países da civilização ocidental possui ainda menos direitos de que os párias nas Índias, constitui o último vestígio da escravidão seja qual for o regime político-social que vigore.

À prostituição neste Ocidente pretensamente culto chamam ainda de mal necessário certos sociólogos de fancaria que também explicam a guerra com a mesma estúpida expressão. Não é este o lugar de discutir com eles, nem de apresentar as soluções convenientes para o chamado problema da prostituição.

Por agora, ao estudar a manifestação da sexualidade mórbida a que se chamam de prostituição, quisemos assinalar que ela é a mais nítida expressão de socialização das mulheres, do regime cooperativista aplicado à satisfação dos apetites sexuais dos homens – e apenas destes.

Está radicada a convicção, entre a maioria das pessoas de que há mulheres que se entregam à prostituição por prazer, por “vício” como é o costume dizer. Não é verdade. São todas impelidas a isso pela miséria. O Dr. L. Bizard que, durante 25 anos, visitou nas prisões de Paris, mais de meio milhão de prostitutas, declarou que apenas uma lhe confessara ter-se prostituído por prazer.

O Dr. A. Tardieu exprimiu-se assim: “As prostitutas, uma vez arregimentadas, ficam ligadas por um contrato de ferro: as vítimas debatem-se em vão, sob a terrível tirania: devem à profissão a sua saúde, o seu tempo e o seu corpo. A tarefa não dá, em troca mais do que vestuário e alimentação”.

A miséria gerou aquilo a que hoje, já se chama aliás com muito pouca propriedade, o “proletariado do amor”, e que o capitalismo explora em grande escala. O lenocínio é uma indústria florescente em todos os países, dando lucros fabulosos. Os grandes bandidos como Al Capone e Jack Diamond, enriqueceram com ele.

A prostituição masculina, não a pseudo-homossexualidade, mas a dos homens que fazem negócios com as suas carícias começa a definir-se e não constitui ainda uma instituição social. Ainda está na fase intermediária do meretrício.

Os seus profissionais aparentam ou têm de fato – outros ofícios: tenores, bailarinos, cabeleireiros, condutores de automóveis, militares dos postos inferiores, etc. 

As mulheres que procuram essa espécie de prostitutos são aquelas que, pela idade avançada ou repugnante aspecto físico, não encontram homens que desinteressadamente satisfaçam seus desejos sexuais.

Como pertencem à classe burguesa, à alta burguesia sobretudo, constituem mais uma manifestação do estado de apodrecimento a que chegou essa classe. 

Como esse tipo social vai desaparecer, dentro em breve, e o gênero de prostituição a que oferece mercado não se generalizou ainda, o fenômeno não exige estudo especial.

Arqueologia do meretrício
A prostituta, na Grécia era porné ou auletrida. Na Índia, dovadassi, quando bailadeira ao serviço de Shiva, ou natché; na Babilônia, pariunstu; no Japão djyoio; e, no Egito, alimé, que significava sábia experiente e em Roma foi meretrix e prostitutae.

De lá, nos vieram com essas designações, os dois tipos de comerciantes dos prazeres sexuais, embora tivesse havido uma alteração semântica, no significado das duas palavras.

Então, a meretriz era a mulher livre, que durante o dia fazia vida regular indo à noite, para os lupanares.

As prostitutas eram quase sempre escravas, que permaneciam nos prostíbulos, - pequenas celas, cuja porta era velada por uma cortina, - nos bairros de Subura e do Esquilino, e nos arredores do Coliseu, aguardando a ínfima plebe os soldados, os gladiadores e os forasteiros.

As meretrizes romanas exerciam sua profissão com um certo recato, nos fornices, covas ou casas abobadadas; as prostitutas praticavam-na às escâncaras, às vezes, até, sem correr a cortina da cela.

Hoje, a designação de prostitutas é genérica, reservando-se a de meretrizes para as de mais baixa estofa as que ainda há pouco, se chamavam “mulher de porta aberta”.

Conforme os locais onde faziam o seu comércio, as suas preferências, a sua anterior condição social, as prostitutas em Roma chamavam-se: alicariae, casoritae, copae, diatrolae, porariae, libtidae, noctunigitae, prosedae, pregrinae, putae, quadrantariae, seratiae, scrotae, vagae, etc.

Essas mulheres, para se distinguir das demais eram obrigadas pelos edis de quem dependiam, a usar apenas a toga viril, com mitra e véus amarelos.  Essas condições e limites persistem por toda a Idade Média, apesar de o cristianismo encontrá-las repetidas, como à promiscuidade dos primitivos povos bárbaros sucedeu a civilização, trazida, para nós, pelos fenícios, gregos, cartagineses e romanos, e adotada pelos godos e árabes.

Ao definir-se a independência do pequeno Estado português, não havia tempo para adotar medidas relativas à prostituição, que aliás não tinha um caráter mercantilista nítido. Afonso Henriques apenas adotou sanções contra as “barregãs de clérigos” e estas não eram mancebas públicas.

Então, e durante muito tempo, o concubinato era legal havendo três espécies de casamento:
·         O que era abençoado pela Igreja e considerado indissolúvel;
·   O que se limitava ao contrato matrimonial e só tinha efeitos civis, sendo o cônjuge conozudo (conhecido);
·       E o mesmo não sendo o cônjuge conhecido isto é, realizado por contrato secreto, que era o preferido pelos clérigos.

Foi o rei Afonso IV quem determinou que os casamentos fossem feitos sempre na presença de um padre e do tabelião e registrados num livro, reprimindo assim o concubinato e a poligamia legais.

Foi também esse rei o primeiro a decretar “que as meretrizes vivessem em bairros separados da outra gente e houvessem sinais e divisas para se distinguirem das mulheres honestas e honradas”.

Parecem que tais determinações não foram cumpridas, porque só muito mais tarde se criou em Lisboa a “Horta da Mancebia”, destinadas às “molheres mundanaes ou mancebas solteiras que fazem pellos homes” Nos séculos XIV e XV, as portas da “Horta da Mancebia” fechavam ao anoitecer.

O local com a mesma designação e habitantes, existia ainda em 1784. Os proprietários das casa da “Horta da Mancebia”, desde que o Estado protetor lhes garantia as inquilinas, trataram de levar as rendas, a ponto de, no ano seguinte, o rei de “boas memória” nomear “dous homes bôos” para avaliar as casas, porque, diz a carta régia: “aquelles cujas cassas das ditas ruas som por as ditas molheres nas ditas cassas nom auerem de morar prooem as ditas cassas em tam grandes contias que elas as nom podem alugar”.

Os honrados procuradores do povo é que não se conformavam com tais medidas, apesar de tudo, benignas. Insistiram, na Côrtes de Elvas, de 1399, pela imposição do traje diferencial às prostitutas, não sendo atendidos pelo rei.

Voltaram à carga, nas Côrtes de Evora, de 1481, pedindo ao rei, “que as rameiras não usem mantilhas: que andem em corpo e sem chapéus e com véus açafroados para que seja distinguidas das mulheres honestas”. 

Ainda pediram os mesmos procuradores, ao rei João II que providenciasse para que as tais mulheres “não vivam entre as mulheres casadas e honestas de bom viver; e lhes seja assinado lugar onde vivam e as vão buscar os que com elas quiserem fazer cama...”.

As coisas não melhoraram com o passar dos anos: antes as navegações e os comércios fomentaram a prostituição, desmarcadamente. A tal ponto que o pobre rei Sebastião se viu forçado, a instância dos oradores de Lisboa, representados pela sua pudibunda vereação, a tomar medidas importantes.

Chamou ao Paço de Sintra, os vereadores, o Governador da Casa Cível e outras autoridades e, ouvido o seu conselho, resolveu publicar um Alvará com estas determinações:
“Todas as molheres solteiras que recolhem homens em suas casas por dinheiro se passem logo e vivam daqui em diante nos bairros abaixo declarados: nos becos dos acuquares, nos becos e travessas que estão passando os Fiéis de Deos: nas travessa de Sancta Marinha: e isto além das casas que ora chamão da Mancebia detraz dos Estaos”.

Também este Alvará nomeava avaliadores, para livrar as mulheres, que assim encurraladas em “ruas sujas”, da ganância dos senhorios.

A Igreja católica e a prostituição - Segundo João Bonnefon
 A despeito dos anátemas dos seus Doutores e das curiosa interpretações dos seus teólogos, a Igreja católica não só fomentou o meretrício como o organizou e explorou em seu proveito. Prova-o a história desde o princípio deste milênio. Quem o afirma não é nenhum livre-pensador inimigo do catolicismo, mas um escritor de grande talento, católico praticante, cuja ortodoxia nunca foi posta em dúvida, João de Bonnefon.

Esse publicista católico escreveu em “La Raison”, de agosto de 1908: A prostituição regulamentada é uma instituição católica. Os papas, soberanos temporais, soberanos espirituais fomentaram praticamente o desenvolvimento legal da prostituição.

“O primeiro lupanar pontifical foi estabelecido por Bento IX. As “senhoras” deviam todos os dias assistir, muito cedo, a uma missa especial. Os clérigos, prelados e nobres não deviam ser recebidos a não que estivessem munidos de um “Indulto”. A casa devia estar fechada na Semana Santa. A tarifa era modificada segundo as festas da Igreja sendo mais elevadas nos “dias santos”.

A “senhora”, depois de suas despesas todas pagas, devia dar um terço de seus lucros ao Esmoler Pontifício e outro terço ao Mordomo de Sua Santidade. O último terço era reservado à diretora, para as “despesas de seu zelo”. Isso disse o insuspeito Bonnefon, já em nossos dias sem que fosse desmentido.

Vamos porém completar as suas informações, com outras, valiosas coligidas pelo Prof. C. Bernesi, para o seu ensaio “A Igreja e a prostituição”.

“O cardeal Barónio, o grande analista da Igreja romana falando dos papas do século X, exprime-se assim, relativamente ao ano de 912:

“Mais horrível que nunca era então o aspecto da Igreja romana! As cortesãs mais degradadas e as mais poderosas dominavam Roma e a seu talante, distribuíam bispados ou demitiam os bispos: e, o que é mais horrível de dizer e de explicar, colocavam na cadeia de São Pedro, os seus amantes, falsos pontífices que só devem figurar no registro dos papas para efeitos cronológicos.

“No século XIII Guilherme Durantis, bispo de Mendes, escrevia que em Roma as mulheres públicas iam viver para junto das igrejas na vizinhança do palácio do papa e da morada dos bispos e que os cortesãos do papa as visitavam assiduamente.

“O jesuíta Xavier Bettinelli diz da corte papal em Avinhão: ”Era um concurso de belezas celebres que se ofereciam em espetáculo muitas vezes por dinheiro”. Petrarca deixou-nos um quadro completo da Babilônia de Avinhão. As seguintes anedotas dão uma pequena idéia.

“Um septuagenário, Clemente VI, - lascivo como um bode – manda de noite procurar uma bela rapariga. Ela vem pensando que quem a chama é um jovem prelado, e é introduzida no quarto do Papa. Quando percebe que em vez de um mancebo é um velho idiota e nojento, olha-o indignada e grita que foi enganada e que não quer nada com semelhante imbecil. O velho Pontífice luta mas em vão! No fim, retira-se para um gabinete contíguo: reveste-se com os paramentos pontificais, coloca a tiara e nesse aparato apresenta-se à rapariga, dizendo-lhe: Recusarás resistir ao Soberano Pontífice? “Ela então cede”.

“Podem contar-se por milhares as aventuras deste gênero. Jerônimo Squarciatico, o mais antigo biografo de Petrarca, contou o seguinte: “Quando Bento XII ocupava a cadeira pontifícia em Avinhão Petrarca que habitava a cidade pontifical, tinha uma irmã chamada Selvaggia.

O Papa reparou nessa rapariga de rara beleza e desejou possuí-la. Encontrara nos cofres da Santa Sé imensos tesouros acumulados no precedente pontificado. Supunha, portanto, que tudo devia ceder perante o poder do ouro. Mandou chamar Petrarca, pedindo os favores de sua irmã Selvaggia e prometendo-lhe como recompensa o cardinalato. O celebre poeta recusou, indignado, o ignóbil negócio e respondeu que nunca aceitaria a púrpura romana em troca de tal infâmia repelindo-a como ofensa.

“Bento XII, irritado resolveu denunciar Petrarca, como herético, aos inquisidores. O poeta, porém, prevendo que o devasso Pontífice o condenaria à morte, fugiu toda pressa de Avinhão. Antes de partir recomendou insistentemente ao seu irmão Gerardo, que vigiasse a sua querida Selvaggia. O miserável Gerardo, menos escrupuloso que seu irmão, não pode ficar insensível às grandes riquezas oferecidas pelo Santo Padre e entregou-lhe a bela Selvaggia. Uma noite, enquanto dormia, foi transportada para o leito do Pontífice; tinha apenas dezesseis anos... As lágrimas, os suspiros da bela vigem deram apenas como resultado excitar ainda mais a paixão do lúbrico velho.

“Selvaggia implorou a sua piedade, lançou-se aos pés, mas em vão. Quando este horrível sátiro se saciou um pouco com o comovente espetáculo, lançou-se sobre a virgem e abafou os seus gritos com os beijos babosos da sua boca sacrílega”.
  
 “O que foi a corte Pontifical e o que foram as Côrtes dos altos dignitários eclesiásticos, mostram-nos as crônicas dos Concílios. O de Constância fez ir para esta cidade 450 cortesãs, para os prelados, como conta um contemporâneo.

O Papa Inocêncio IV foi para Lião, com a sua corte, e reuniu aí, um concilio geral (1251). O historiador Mateus Parigi, monge beneditino conta que o Papa antes de deixar a cidade, encarregou um cardeal de agradecer a população o acolhimento que lhe tinha feito e a sua côrte. 

O cardeal depois de ter reunido as personagens da cidade fez-lhes um discurso, no qual disse entre outras coisas: “Meus queridos amigos, entre outras vantagens que a vossa cidade recebeu com a permanência da corte pontifical, é preciso que não deixe de mencionar o progresso dos bons costumes e da moralidade pública. Quando viemos aqui, havia três ou quatro casas habitadas por mulheres de má vida; agora deixamos apenas uma: estende-se da porta oriental à porta ocidental”. 

“A Roma pontifical era um vasto prostíbulo. Um viajante, que a visitou no século XVII, escreveu: “Roma, vergonhosamente privada de navegação e de tráfico, seria a cidade mais miserável da Itália sem a bicharia do clero, dos judeus e das cortesãs que formam o conjunto da população.

“No fim do século XVIII, conforme uma estatística verídica havia, em Roma, 6.800 prostitutas e nessa época, a cidade devia ter uns 100.000 habitantes.

“Depois de conhecermos os costumes da corte pontifical não é nada entranhável ver papas fundar casas de tolerância.

“Cornélio Agripa de Netteshein, no seu livro De Incertudine et vanitate scientiarum, afirmou que o Papa Sixto IV (1471-1484) fundou em Roma três lupanares, onde as cortesãs obrigadas a pagar-lhe cada semana um júlio de ouro lhe rendiam, por ano, vinte mil ducados.

O mesmo autor assegurou que o Papa dava esses lupanares aos padres, com benefício e que ouviu falar de um prelado romano detentor de dois benefícios, de uma paróquia de 20 ducados, de um priorado de 40 ducados e de três prostitutas num bordel que cada semana lhe entregavam 20 júlios.

Além deste Sixto IV, Papa alcoviteiro, houve outros que regulamentaram a prostituição, colhendo dela benefícios para a Igreja ou reservando-os para si. Assim, Bento IX já citado por Bonnefon, concedeu o monopólio da prostituição a uma penitente, de quem tinha sido confessor.

Pelo breve Honestale, diz Bernessi – deu a essa dama o direito de reunir, sob o mesmo teto, raparigas sãs, mas já afeitas ao vício. A diretora era obrigada a mandar ouvir missa todas as manhãs, às suas pensionistas. A missa era celebrada por um padre idoso, na igreja de Santa Maria, um pouco antes da alvorada.

“As pensionistas da favorita de Bento IX eram obrigadas, quando saíam, a vestir-se de negro e a pôr um véu que dissimulavam a sua aparência. Na casa de tolerância podiam vestir-se com esmero, mas os seus vestidos deviam ser ajustados e bem abotoados. 

Num compartimento do rés-do-chão, a diretora podia oferecer aos clientes diversas pensionistas, ao mesmo tempo, mas sua presença era indispensável a fim de que não faltasse às leis da honestidade.

“Cada visitante só podia escolher uma mulher de cada vez. Os quartos deviam ser hermeticamente fechados, de maneira que nenhum ruído se ouvisse exteriormente e que as vozes não pudessem chegar até os habitantes das casas vizinhas. O mesmo visitante podia apresentar-se duas vezes por dia, mas para se isolar com a mesma mulher. Os clérigos, os prelados e os monsenhores só podiam ser recebidos quando trouxessem um Indulto.

“A casa tinha três categorias e a tarifa era proporcional às comodidades do quarto, à idade da mulher e ao grau de dignidade do santo do dia. Nas grandes solenidades, as tarifas deviam ser aumentadas, em proporções extraordinárias. Durante a Semana Santa a casa conservava-se encerrada e a fachada “de luto”. A lista dos visitantes era rigorosamente conservada.

Um dos médicos do Papa devia assegurar-se da saúde das mulheres “com decência, mas com exatidão”. Não podia haver lá mulher que fosse “irmã de um cardeal”. A igreja tirava rendimento desta casa. 

O regulamento era acompanhado de um a tarifa que, infelizmente, está omitida dos altos pontificais. O último parágrafo diz-nos que a mulher, depois de pagar suas despesas, devia dar um terço do seu ganho ao mordomo de Sua Santidade, enquanto que o último terço revertia para a diretora "em recompensa de seu zelo “.

O Papa Júlio II concedeu às prostitutas um bairro especial em Roma, por Bula de 10 de janeiro de 1510. Leão X publicou três regulamentos, para salvaguardar a decência exterior e a boa ordem da confraria das p

rostitutas romanas. Enfim Clemente VII ocupou-se da questão do testamento das prostitutas.
“Obrigou-as a levar metade seus bens ao convento de Santa Maria da Penitência. Para se subtraírem a esta doação obrigatória, as cortesãs punham as suas economias em usufruto. Mas Clemente descobriu este subterfúgio e lançou excomunhão contra os que consentissem em tais usufrutos. O marechal de Roma, encarregado da polícia urbana, recebia o aluguel das casas de prazer. E isto durou até 1870!

“Em 1556 o duque de Guise, que tinha entrado em Roma com o exército francês fez enforcar o marechal, porque os seus subordinados arrastavam os soldados “para lugares maus e nefastos à saúde”.

“A meio do século XVI, o Papado correu o risco de perder o monopólio da prostituição. Marcebos da nobreza romana levavam para suas próprias residências as raparigas das casas públicas. Então, o Papa interveio, estabelecendo que quem fizesse sair um rapariga de uma casa pública seria punido “com a amputação da mão direita ou com o exílio” conforme a qualidade do culpado.

Os lupanares autorizados pelos Breves e Indulgências multiplicavam-se. No século XVIII, contavam-se vinte e dois. O mais elegante era reservado “aos nobre estrangeiros e os membros do corpo diplomático”.

Esta casa era análoga às nossas modernas casas de pasto. Frequentavam-na raparigas da pequena burguesia e sobretudo da burocracia pontifical. Encarregavam as mais habilidosas de fazer falar o cliente diplomata ou de revistar as suas algibeiras.

Em 27 de janeiro de 1779 o secretário da embaixada da França foi despojado de toda a correspondência trocada entre o arcebispo de Paris e o embaixador do rei. A Santa Sé teve a audácia de fazer uso desta correspondência. O escândalo rebentou. O Papa teve de restituir a correspondência e pedir desculpas.

Depois de vermos como era cultivada a prostituição na Roma pontifical, inútil se tornar acentuar que os exemplos do alto frutificavam e multiplicavam-se no baixo clero. Nas ordens monásticas, sobretudo, a depravação não tinha limites.

Os conventos religiosos eram os grandes lupanares daquele tempo. Não só os príncipes e nobres tinham lá suas amantes como os simples fidalgos e escudeiros, eclesiásticos e mercadores iam a esses bordéis escolher mulher, para uns dias ou para uma noite.

Nos últimos séculos, a concorrência às grades dos conventos era feita principalmente por uns pretensos poetas que com o pretexto de glosar motes iam combinar com as freiras as suas entrevistas. Tudo isto se fazia ostensivamente não obstante a repressão legal.

Em Portugal, a legislação a esse respeito é abundantíssima. O Dr. Asdrubal de Agum, num dos seus trabalhos, cita quatro cartas de lei, destinadas a reprimir a devassidão nos conventos, aplicando a pena de morte, com as datas de: 13.01.1603; 30.04.1653; 01.08.1655 e 03.11.1671.

A última expedida por Pedro II e muito expressiva, pois diz assim: “Faço saber etc., que por me ser presente o grau de excesso e demasia com que dalgum tempo a esta parte se continua, assim nesta Corte como no Reino com notório escândalo o trato e amizade ilícitas, com religiosas, violando uns sua clausura, com fim desonesto (de que há poucos anos chegarão a público alguns casos nos juízos eclesiásticos e seculares) e outros continuando nas grades dos conventos com trato e amizade indecentes etc”.

Contudo, desde as Ordens Manuelinas e a entrada em Mosteiros para ter relações ilícitas com freiras, era punida com morte natural e cem cruzados para o Mosteiro. O rapto de freiras tinha a mesma punição se fosse praticado por peões. Quando eram nobres os prevaricadores iam degredados para S. Tomé e mais tarde para o Brasil. As simples relações com freiras, embora fora dos mosteiros eram punidas com açoites e cinquenta cruzados para o convento, sendo praticadas por peões e com degredo para a África, por dois anos, sendo-os por nobres. 

A despeito dessa repressão, aparentemente severa, os conventos foram sempre grandes lupanares. A este respeito escreveu o Dr. Tovar de Lemos: “A desmoralização do clero erguia por toda a parte clamores intensos sendo principalmente nos claustros das ordens religiosas que se encontravam a maior relaxação. Não só diz-nos Coelho da Rocha, estava esquecida a obrigação dos votos e a disciplina das regras, mas nem ao menos eram respeitadas as leis do decoro.

“No Convento de Lorvão de que era abadessa D. Filipa d’Eça havia 170 freiras entre professoras, noviças e conversas a maior parte nascidas no Convento”.

Do que era a desmoralização religiosa no século XV, dá-nos uma idéia Pinheiro Chagas na “História de Portugal”:

“Do mosteiro do Recião era abadessa D. Clara Fernandes, filha do Conde de Marialva. Não sabia ler nem escrever e fora o pai que a colocara naquele convento. Dizem os documentos, que dormia carnalmente com quem lhe aprazia e em especial com Álvaro de Alvellos de quem tinha filhos. Outra sua companheira Maria Rodrigues, era pública e notoriamente amante do abade de Melcões de que tinha também filhos”.

As famosas “Cartas”, atribuídas a Mariana Alcoforado, são um documento contundente do erotismo conventual no século XVII, até nas mais remotas terras da província. O serralho que o rei João V tinha no Convento de Odivelas define a devassidão monástica do século seguinte.

O Dr. Tovar de Lemos, referindo-se em nota, no seu trabalho “A prostituição”, às Ordenações que nesta ordenação de Sevilha estivesse expresso que só as mulheres públicas podiam freqüentar as casas de prostituição, todavia está provado que existiam casas de entrevistas chamadas Mosteiros e que as dona das casa, a Mayorala, tinha o título de Abadessa e recebia uma retribuição dos fregueses do seu convento. Estes títulos parecem ser uma sátira cruel dos costumes das comunidades religiosas.

Maria Madalena – Símbolo do arrependimento
Maria Madalena, famosa prostituta arrependida da Galiléia, representa que, para ser salva, a mulher precisa abandonar a profissão. Conhecida como a ex-prostituta da Galiléia, Maria Madalena foi uma das mais fiéis seguidoras de Jesus Cristo.

De acordo com a Bíblia, ela estava presente em sua crucificação (Marcos 15.40) e em seu funeral. Foi ela quem encontrou vazio o túmulo de Jesus, ouviu de um anjo que ele havia ressuscitado e foi dar a notícia aos apóstolos (Marcos 16.1-9).

Prostituta com papel de destaque na história de Cristo – foi, inclusive, canonizada pela igreja católica -, Maria Madalena personificou o estereótipo de “prostituta arrependida”, acabou por disseminar uma imagem negativa sobre a prostituição, ao reforçar a idéia de que é preciso abandonar a atividade para redimir-se dos pecados e ser perdoada por Deus.

Durante a Idade Média, as prostitutas atuantes eram excomungadas da igreja católica. Mas as que se arrependiam eram perdoadas e aceitas pela sociedade. Houve até um movimento de conversão, em que a igreja estimulou fiéis a “recuperar” prostitutas e casar-se com elas.

Também surgiram comunidades monásticas de ex-prostitutas convertidas, que receberam o nome de “Lares de Madalena”. Elas proliferaram pela Europa, tendo sido financiadas, em sua maioria, pelo clero. Além de Maria Madalena, a igreja enalteceu diversas outras prostitutas que salvaram suas almas pelo arrependimento, como Santa Pelágia, Santa Maria Egipcíaca, Santa Afra e outras.

O que diz a Bíblia sobre a prostituição
É a segunda obra da carne (Gálatas 5.19), e o sentido que comumente se atribui a palavra é como sinônimo de fornicação, isto é, a prática sexual pré-matrimonial. Isto é prostituição, sim, mas prostituição não é somente isto.

As palavras podem ter seus sentidos alterados de acordo com o contexto em que estão inseridas. Assim, essa palavra pode adquirir outros sentidos, de acordo com o sentido que o Autor quiser lhe emprestar.

No mundo, a palavra prostituição pode ser relativa a uma troca imoral. Pessoas que dão coisas para receber outras coisas, prática esta que ofende a moral e ética. Mulheres e homens que alugam seus corpos por dinheiro, bens, necessidades.

Também fizeram passar pelo fogo a seus filhos e suas filhas, e deram-se a adivinhações, e criam em agouros; e venderam-se para fazer o que era mau aos olhos do SENHOR, para o provocarem à ira (II Reis 17.17). Isto é uma forma de prostituição que gostaria que ficasse claro para todos quantos se dizem cristão e se ufanam como sendo "filhos de Deus".

Prostituir é vender a própria honra, a própria dignidade, é sacrificar o amor-próprio e a auto valoração em troca de alguma outra coisa. Nós frequentemente somos forçados a escolher entre o que é reto aos olhos de Deus, aquilo que Deus quer e exige de nós, é aquilo que é melhor (pelo menos aparentemente) aos nossos olhos.

Como ocorreu em Números 25, que para possuírem as mulheres moabitas, os hebreus adoraram os deuses estranhos, e se inclinaram diante de ídolos feitos por mãos humanas.

Nesse sentido, Adão e Eva se prostituíram quando a desobedeceram a Deus para poder saborear o fruto da árvore da vida (Gênesis 3.6).

Abraão prostituiu-se quando mentiu para não correr o risco de ser morto por causa de sua linda mulher (Gênesis 12.12 e 20.2). Isaque repetiu o mesmo erro (Gênesis 26.7). Jacó mentiu para obter a benção de seu pai (Gênesis 27.19).

Ocorre a prostituição quando as pessoas da igreja se vendem para obter o que desejam ou almejam. Negam a sua fé em Cristo, jogam para fora a honestidade e a pureza de suas mãos por dinheiro, por prazer, pela fama, pela diversão.

E isto, infelizmente é comum e rotineiro em nossas igrejas: pessoas que vendem a própria fé, a própria paz, a comunhão com o Espirito de Deus por dinheiro, por prazer e por uma qualquer outra mórbida forma de satisfação...

Simão Pedro prostituiu-se para não ser capturado e morto com Jesus (João 18.17, 25 à 27), mas depois de revestido com o poder do Espirito Santo, recusou-se a prostituir por dinheiro (Atos 8.18-20).

Isto é o que quero transmitir para ti, e preciso que fique claro: toda vez que alguém que se diz cristão, deliberada e espontaneamente faz qualquer coisa contrária à palavra de Deus, para ganhar algo ou não perder algo que tem, está se prostituindo.

Jesus tem que valer mais do que tudo em nossas vidas, e por ele temos que renunciar a tudo. Enquanto houver alguma coisa no mundo que valha tanto ou tão mais do que Jesus, estamos sujeitos a nos prostituir para tê-lo ou não perdê-lo.

Pecado não é somente uma transgressão à lei de Deus, como muitos pensam e ensinam. Pecado não é somente o que não provém de fé. Pecado é tudo o que fere, magoa e entristece o coração e o Espírito de Deus.

Toda vez que você faz alguma coisa, qualquer coisa, de forma consciente e deliberada, que venha a magoar, entristecer o coração de Deus para conseguir satisfazer uma necessidade, um desejo, um capricho, uma "inclinação da carne" (concupiscência), você estará vendendo a sua fé, sacrificando a sua comunhão e comunicação com Deus. A carne estará se manifestando e dominando a sua vida, a sua alma, o seu espírito.

E o mais terrível de tudo com a prostituição é, que todos quanto a praticam serão julgados pelo próprio DEUS “Venerado seja entre todos o matrimônio e o leito sem mácula; porém, aos que se dão à prostituição, e aos adúlteros, Deus os julgará” (Hebreus 13.4).




Jairzinho Viana
Apologista cristão, Ministro, Líder fundador da Igreja Pentecostal da Anunciação (IPA) na Cidade de Parauapebas e Presidente da Mesa Diretora.






Referências:
Bíblia Sagrada (João Ferreira de Almeida – Corrigida e Fiel).
ROSSIAUD, Jacques. A Prostituição na Idade Média. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. 224 pág.
RAGO, Margareth. Os Prazeres da Noite: prostituição e códigos da sexualidade feminina em São Paulo (1890-1930). São Paulo: Paz e Terra, 2008. 360 pág.
BRASIL, Jaime. A questão sexual.

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